Texto publicado na Folha do Trabalhador nº 23
maio de 2015
O direito, para o marxismo, faz parte da "superestrutura" da sociedade (assim como a filosofia, a religião, a cultura), ou seja, é influenciado pela "base" material e econômica de tal sociedade. Um sistema feudal, por exemplo, terá um discurso jurídico e político que corresponda às suas bases feudais. Essa relação, contudo, não é sempre automática ou "mecânica", pois a superestrutura também influencia a base, em uma espécie de equilíbrio dialético.
Como a superestrutura também influencia a base, ela pode ser utilizada para trazer melhorias para a classe trabalhadora, mesmo que o sistema dominante seja o capitalismo. No caso da ordem jurídica, isso quer dizer que direitos e garantias podem ser buscados, através das instituições (Legislativo, Judiciário etc.), para melhorar a vida dos trabalhadores. É claro que isso é um trabalho difícil, pois os grupos dominantes sempre tentarão impor sua vontade, e farão o possível para evitar que sejam aprovadas leis que tragam melhorias. É por isso que o trabalho nos sindicatos, nas associações de moradores, grêmios estudantis etc. é importante, porque são armas que a população possui para combater os grupos dominantes. Às vezes, sem perceber estamos fazendo o jogo dos exploradores, porque, como disse, Marx, "as ideias dominantes são as ideias da classe dominante". Isso é mais um motivo para que fiquemos alertas, não admitindo que esses exploradores possam prejudicar os nossos direitos.
Assim, os direitos trabalhistas que possuímos -carteira assinada, décimo terceiro, férias etc.- não "caíram do céu", e sim foram conseguidos através de muitas lutas e reivindicações. Muitos lutadores passaram sofrimento, tortura e morte para que, hoje, a classe trabalhadora possa usufruir tais direitos. A legislação trabalhista atual não é perfeita, mas é uma conquista histórica e deve ser protegida.
Contudo, assim como o direito consolida melhorias para os trabalhadores (mas sempre através de luta, lembre!), ele também é utilizado para prejudicar a população e reforçar a hegemonia dos grupos no poder. Constantemente o Congresso Nacional (que é composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal) tenta lançar alguma medida legislativa que traga danos e prejuízos para a classe trabalhadora. Isso ocorre porque o Congresso é dominado por interesses econômicos e políticos contrários ao povo, e portanto faz tudo na defesa de tais interesses, mesmo que para isso violentem a própria Constituição.
Um exemplo de ataque legislativo contra os trabalhadores está no PL (Projeto de Lei) nº 4330, que quer liberar a "terceirização" no Brasil. Isso é muito ruim, porque reduzirá as contratações de emprego (afinal, por que o empresário vai empregar alguém se pode simplesmente contratar uma empresa terceirizada para realizar a atividade?) e prejudicará os trabalhadores terceirizados (que sempre receberam muito menos e sofrem muito mais acidentes de trabalho do que os empregados realmente contratados). Além disso, caso os trabalhadores terceirizados não recebam seus salários, não poderão cobrar da empresa que contratou os serviços. Primeiro precisarão cobrar da empresa terceirizada, e só ao final, caso a mesma não seja localizada (pois é fácil criar empresas-fantasmas no Brasil, para não pagar direitos trabalhistas), o trabalhador terceirizado poderá cobrar da empresa que contratou os serviços. Isso se chama "responsabilidade subsidiária" (processa uma, caso não pague, aí processa a outra). Ora, até lá o trabalhador e sua família já morreram de fome!
Outro exemplo de ataque contra os trabalhadores: o papo sobre redução da maioridade penal. Esse é outro absurdo que os grupos dominantes querem empurrar contra o povo. Se a redução acontecer (de 18 para 16), ficará legalizada na prática a matança contra a juventude negra proletária, que é a maior vítima da violência policial nesse país. Enquanto riquinhos e playboys continuarão aprontando, sem que sejam punidos -possuem bons advogados, papai pode subornar autoridades etc.- os jovens negros proletários serão ainda mais criminalizados e discriminados do que já são. Além de tudo isso, qualquer um pode perceber que trancafiar garotos de 16 anos em penitenciárias com criminosos perigosos não só não vai recuperar o jovem delinquente como vai deixá-lo ainda pior! Mas a burguesia dominante não está nem aí para isso, pois o que eles querem mesmo são motivos para trancafiar para sempre ou eliminar de vez a juventude pobre.
Esses são exemplos de como o direito (leis, Poder Judiciário etc.) é uma arena de luta importante. Pode trazer benefícios ou prejuízos para o trabalhador. Por causa disso, é importante participar também dessa arena, mas sempre sem esquecer que, como falamos no início deste texto, o direito reflete a base material da sociedade, portanto apenas só derrubando o capitalismo teremos um direito verdadeiramente a serviço do povo.